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A história do universo Marvel e como o MCU muda as páginas da cultura pop

a história do universo Marvel

Homem de Ferro. Capitão América. Thor. Hulk. Viúva Negra. Gavião Arqueiro. Os Vingadores. A maior franquia da história dos cinemas. Que hoje não é só essa lista de heróis. Homem-Aranha, Homem-Formiga, Capitã-Marvel, os Guardiões da Galáxia, Doutor Estranho, Pantera Negra, além de um extenso elenco de coadjuvantes de luxo, com narrativas próprias e motivações. A história do universo Marvel, do universo cinematográfico da Marvel, totaliza US$ 22,55 bilhões em bilheterias, e filmes que comovem multidões.

Mas nem sempre foi assim.

O recorte que pegaremos é a Marvel de 1993. Era uma empresa em colapso, acumulando dívidas que não conseguia pagar, até que, em 1996, se viu obrigada a declarar falência. Um terço de seus funcionários foi demitido para equilibrar o déficit. Disputas internas e um cenário de tensão e instabilidade tomava a Casa das Ideias.

O que era discutido naquele momento era como tornar a Marvel lucrativa novamente. Entre ideias malucas, como restaurantes temáticos e figurinhas ilustrativas, o caminho que, entre trancos e barrancos, se mostrou mais bem-sucedido, foi investir na Marvel Studios e seus filmes. 

Entre trancos e barrancos porque esses filmes não davam de fato dinheiro. A maioria dos direitos dos personagens da Marvel foram vendidos para outros estúdios, como uma medida analgésica, para ganhar dinheiro rápido, em uma estratégia de curto prazo. A retomada do cinema de super-heróis, com Blade, X-Men e Homem-Aranha, de nada trouxe os louros ao estúdio.

Em 2003, depois do sucesso dessas primeiras franquias, foi a figura de David Maisel que entendeu que havia algo de errado nessa engrenagem. Não fazia sentido dar de mão beijada seus personagens, seus recursos, para que outros estúdios lucrassem em cima. Planejou internalizar essa operação, trazendo de volta a marca Marvel Studios. Em 2005, como presidente, concebeu o modelo financeiro que tornaria a reformulação da Casa das Ideias possível.

Maisel deu o famoso all-in: para garantir um financiamento da Merrill Lynch, em um contrato de sete anos, que garantiria US$ 525 milhões para a criação efetiva do estúdio, a Marvel colocou 10 de seus personagens como contrapartida: Capitão América, Os Vingadores, Nick Fury, Pantera Negra, Homem-Formiga, Manto & Adaga, Doutor Estranho, Gavião Arqueiro, Quarteto Futuro e Shang-Chi. Se o plano fracassasse, a Marvel perderia os direitos de todos esses personagens – e o que conhecemos hoje seria apenas uma realidade alternativa desse multiverso da loucura proposto pelo estúdio que tem um futuro brilhante pela frente.

Acontece que por aquelas contingências da vida, o responsável por dar início ao ciclo de ouro da Marvel Studios não entrou nessa lista por já pertencer a outro estúdio na hora da contrapartida. Homem de Ferro. Era um personagem de escanteio da Warner Bros., que não tinha nenhum interesse em trabalhar com a figura. Dois meses depois do acordo do financiamento com o Merrill Lynch ser fechado, a licença da Warner pelo herói expirou e os direitos retornaram para o Marvel Studios.

Foi daí que a opção de produzir o filme apareceu. O personagem nunca tinha aparecido em um filme antes, não estava em uma berlinda judicial. Era um jeito de começar leve e testar algumas premissas. Nas telas, eles tinham o super-herói mais humano possível, nas mãos de Robert Downey Jr. No marketing, eles tinham o boneco mais funcional do mundo: uma armadura modular, super tecnológica e irada.

O filme custou à Marvel US$ 140 milhões. Faturou US$ 585 milhões. Um ano depois do lançamento de “Homem de Ferro” (2008), a Walt Disney Company comprou o estúdio por US$ 4,5 bilhões. O resto é história. São mais de 10 anos. A Marvel foi readquirindo os direitos sobre seus outros personagens. Criou o seu conceito UCM (Universo Cinematográfico da Marvel). São 25 filmes, que funcionam de forma independente, mas que estão inseridos dentro de um mesmo universo e que de uma forma sutil se interligam. Tudo para honrar o que sempre lhe foi característico: os quadrinhos e as grandes sagas.

Por mais de 10 anos, a Marvel conseguiu engajar uma grande saga no cinema, que culminou na apoteose “Vingadores: Ultimato” (2019). A reação, de recompensa? Você pode sentir aqui:

Quem viveu esse momento e acompanhou toda esse jornada nunca vai esquecer. É da magnitude de eventos como Star Wars, que interferem totalmente em como é consumida a cultura pop. Você pode estar no sertão de Alagoas, que tem um garoto com um brinquedo do Homem-Aranha e que sabe tudo sobre ele. É esse grau de penetração massiva que a Marvel consegue alcançar. Essa aposta feita lá atrás, de colocar todos os seus bens para jogo, mudou toda a história do entretenimento.

A ordem cronológica da Marvel e como 10 anos de construção terminam no ápice Vingadores Ultimato

Para entender essa construção, a Marvel separa seus lançamentos em fases. Atualmente, o UCM está na Fase 4, consequente ao fechamento de sua primeira grande saga: a das Joias do Infinito. A Fase 1, 2 e 3 são os eventos que acontecem desde “Homem de Ferro” (2008) e terminam em “Vingadores: Ultimato” (2019). 

É a Saga do Infinito, com a grande ameaça Thanos, que quer trazer equilíbrio ao universo, dizimando metade dele, através dessas joias ancestrais que representam um aspecto diferente da existência: espaço, mente, realidade, poder, alma e tempo. Um senso de justiça, que é muito bem tratado ao desenvolver o personagem, embora seja um lunático de carteirinha. Mas tem poder, tem peso. Ainda mais quando é paulatinamente construído ao longo de 10 anos. Quando culmina, culmina pesado.

Para você entender exatamente a distribuição de toda essa jornada, montamos duas listas, uma com a ordem de lançamento dos filmes e outra com a ordem cronológica dentro da linha temporal estabelecida pelo universo da Marvel.

Ordem de lançamento dos filmes da Marvel

FASE 1 – a apresentação dos personagens e o épico Vingadores

  1. Homem de Ferro (2008) 
  2. O Incrível Hulk (2008) 
  3. Homem de Ferro 2 (2010) 
  4. Thor (2011) 
  5. Capitão América: O Primeiro Vingador (2011) 
  6. Os Vingadores (2012) 

FASE 2 – consolidação e exploração de novos formatos

  1. Homem de Ferro 3 (2013)
  2. Thor: O Mundo Sombrio (2013)
  3. Capitão América: O Soldado Invernal (2014) 
  4. Guardiões da Galáxia (2014)
  5. Vingadores: Era de Ultron (2015) 
  6. Homem-Formiga (2015)

FASE 3 – tudo se direciona para a Grande Saga do Infinito

  1. Capitão América: Guerra Civil (2016)
  2. Doutor Estranho (2016)
  3. Guardiões da Galáxia Vol. 2 (2017)
  4. Homem-Aranha: De Volta ao Lar (2017) 
  5. Thor: Ragnarok (2017)
  6. Pantera Negra (2018)
  7. Vingadores: Guerra Infinita (2018)
  8. Homem-Formiga e a Vespa (2018)
  9. Capitã Marvel (2019)
  10. Vingadores: Ultimato (2019)

FASE 4 – consequências da primeira grande saga e as infinitas possibilidades da maior franquia

  1. Homem-Aranha: Longe de Casa (2019)
  2. Viúva Negra (2021)
  3. Shang-Chi e a Lenda dos Dez Anéis (2021)
  4. Eternos (2021)
  5. Homem-Aranha: Sem Volta Para Casa (2021)
  6. Doutor Estranho no Multiverso da Loucura (2022)
  7. Thor: Amor e Trovão (2022)
  8. Pantera Negra: Wakanda Forever (2022)
  9. Capitã Marvel 2 (2022)
  10. Homem-Formiga e a Vespa: Quantumania (2023)
  11. Guardiões da Galáxia Vol.3 (2023)

Ordem cronológica dos filmes da Marvel (em relação aos acontecimentos no universo)

  1. Capitão América: O Primeiro Vingador (2011)
  2. Capitã Marvel  (2019) 
  3. Homem De Ferro (2008)
  4. O Incrível Hulk (2008)
  5. Homem De Ferro 2 (2010)
  6. Thor (2011)
  7. Os Vingadores (2012)
  8. Homem De Ferro 3 (2013)
  9. Thor: O Mundo Sombrio (2013)
  10. Capitão América: O Soldado Invernal (2014)
  11. Guardiões Da Galáxia (2014)
  12. Guardiões Da Galáxia Vol. 2 (2017)
  13. Vingadores: Era De Ultron (2015)
  14. Homem-Formiga (2015)
  15. Capitão América: Guerra Civil (2016)
  16. Viúva Negra (2021)
  17. Pantera Negra (2018)
  18. Homem-Aranha: De Volta Ao Lar (2017)
  19. Doutor Estranho (2016)
  20. Thor: Ragnarok (2017)
  21. Homem-Formiga e a Vespa (2018)
  22. Vingadores: Guerra Infinita (2018)
  23.  Vingadores: Ultimato (2019)
  24. Homem-Aranha: Longe de Casa (2019)
  25. Shang-Chi e a Lenda dos Dez Anéis (2021)

Essa lista está atualizada conforme a data de publicação dessa matéria, que acaba de sair “Viúva Negra” e “Shang-Chi e a Lenda dos Dez Anéis”.

Tão grande para sua geração quanto Star Wars: Marvel muda a cultura pop

Star Wars é o primeiro fenômeno do cinema que influencia diretamente a cultura pop. Com o grande sucesso, sobretudo, do primeiro filme da saga, a LucasFilm e a Fox entraram em um daqueles dilemas bons de se ter: como faturar ainda mais com o que viria pela frente? As duas partes tinham direito de lançar os produtos que quisessem, mas uma vez que alguma delas licenciasse, a outra parte perdia o direito de lançar algo na mesma linha. 

A Fox, com sua cabeça quadrada, fez o arroz com feijão e vendeu cartaz e camiseta. Na cabeça de George Lucas, continuava martelando a pergunta: por que fazer algo que todos já faziam? Decidiu então licenciar, ter os direitos e lançar, com exclusividade, todos os brinquedos do filme: o faturamento na época foi de US$ 200 milhões.

Sabendo do público que seria atingido por seu filme, Lucas se antecipou e deu aos fãs o que eles mais queriam: a oportunidade de levar para casa os personagens que recentemente começaram a amar.

Com o grande sucesso do filme, no natal de 1977, os brinquedos esgotaram e a demanda era muito grande para os fabricantes fazerem a reposição dos que já haviam sido vendidos. George Lucas se contentou com o grande sucesso já feito? Ele sentou e ficou esperando o tempo que os fabricantes pediam para fabricar os pedidos? Não, ele começou a vender caixas vazias e vale bonecos, criando assim a primeira pré-venda da história.

Entre 1977 e 1978, George Lucas faturou US$ 100 milhões em licenciamento. De 1977 até 2012, quando a Disney comprou os direitos da LucasFilm por US$ 4 bilhões, esse número estava na casa dos US$ 28 bilhões.

O cara foi genial. Em 1977. Tem que reconhecer. E fez isso com 3 filmes realmente sustentando seu legado. É um pioneiro. É os Beatles do jogo. Mas o que a Marvel faz é trazer a indústria do rock’n roll, a indústria do rap e a indústria do pop, tudo junto pro jogo.

Construir um universo coeso – antes que ataquem as pedras, claro, tem suas soluções extremamente simplistas e falhas crassas entre roteiro aqui e roteiro ali -, mas que coloca 25 narrativas sob a mesma perspectiva e as conecta dentro de um filme evento, que se torna a maior bilheteria da história do cinema (US$ 2.9 bi), é sem precedentes, é algo digno de registro.

Para além dessa construção monolítica, são mais de 10 anos que as pessoas acompanham as histórias da Casa das Ideias nas telonas dos cinemas. Pessoas que estão crescendo consumindo esse tipo de conteúdo, se apegando a esse universo, a esses personagens, suas motivações, seus dramas, suas falhas e suas conquistas. Reveja o vídeo que abre essa matéria. Ao receber aquilo, você se sente recompensado. É uma relação de fidelidade. Não foi do dia para noite que chegou naquele momento.

E você acompanhou cada passo até lá. Por isso é tão mágico. E isso que só estamos falando de cinema…

Esse é só o começo: a Marvel aperta o botão vermelho, sai do linear e apresenta o multiverso, onde tudo é possível

Falamos até agora de construção. De como a Marvel orquestrou há pouco mais de uma década uma narrativa que beira o impecável sobre os Vingadores, a ameaça Thanos e as Joias do Infinito. Mas como terminar uma obra tão bem e seguir adiante? Como reeducar a expectativa dessa legião de fãs para novos conceitos, novos personagens e novas histórias?

Bem, o aprendizado já estava no que foi a reviravolta lá atrás na década de 1990 e no começo dos anos 2000. Usar os quadrinhos. A Marvel tem um acervo imenso de conteúdo para ser explorado sob seu domínio. E os quadrinhos já esbarraram justamente nesse dilema: e agora? E se? “What If” – “e se”, em inglês -, inclusive, é quadrinho e série da Marvel, que explora as mesmas narrativas do estúdio, mas com versões completamente alternativas. 

Esse é só um exemplo. A coisa foi muito além disso. Realidades paralelas e o tal do multiverso da loucura. Nada mais é linear, tudo é subjetivo. Existem várias realidades, onde tudo é possível. Daí, meu amigo, conceito é uma coisa relativa. Vale tudo. E a Marvel, nessa Fase 4, mostrou ao cinema que está disposta a entrar nessa aventura.

Tem alguns bons motivos: o primeiro é que ela não se prende a nada. Não se prende a atores, tampouco a personagens. Se você partir do pressuposto de que um personagem é apenas uma versão de uma realidade dentre muitas, ele pode ser substituído por qualquer coisa relacionável e compatível. A segunda coisa é que ela consegue integrar novas equipes, que antes estavam sob o domínio de outros estúdios, como Quarteto Fantástico e X-Men. São as mais clássicas formações dos quadrinhos e elas precisavam de um motivo para serem inseridas dentro desse universo.

O terceiro motivo é que dá um tempero a mais nas narrativas. A gente já enxerga isso no próximo filme do Homem-Aranha, em que no seu trailer já confirma participações de atores que interpretaram papéis nos clássicos filmes dos anos 2000, mostrando a intenção de criar mesmo um multiverso não só nos planos que a Marvel tem para os seus filmes, mas como próprio recurso metalinguístico. Recuperar aquilo que não lhe foi dado o louro, mas que foi a vanguarda desses filmes.

A Marvel avança seus planos para além das telonas, investindo no streaming. Quer expandir também esse universo com narrativas que possam ser consumidas nas telinhas. Eles não estão de brincadeira, visto que quem apresenta esse conceito de multiverso, que ditará as regras da Fase 4 e todas as fases conseguintes, é a série Loki, exclusiva do Disney+.

Terminou uma era, mas parece que os planos da Marvel são mais ambiciosos ainda. Tem que ver se vai cuidar com a mesma preciosidade que cuidou de sua formação original. No mais, avante.

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