O Facebook vinha há algum tempo se tornando um retiro de malucos vociferando profecias do apocalipse. Mark Zuckerberg era pivô de teorias da conspiração, tal qual seu compadre Bill Gates, todos seres reptilianos que iriam dominar o mundo, espalhando doenças e inserindo chips na cabeça das pessoas. Aí vem essa: o que é metaverso, cazzo?
A verdade, brincadeiras à parte, é que a grande rede social do mundo começou a demonstrar sinais de cansaço já não é de hoje. Alvo de escândalos, envolvendo vazamento de dados, empresas terceirizadas de curadoria de conteúdo em estado de escravidão e liberdade de expressão para discursos de ódio, o Facebook ainda parecia querer jogar contra as marcas, sua maior fonte de recursos e exposição.
A queda brusca do alcance orgânico, para pequenos empreendedores e veículos de mídia, por exemplo, foi brutal. Um tiro no pé de quem movimentava o consumo de conteúdo e vendas pela plataforma. Você precisa desembolsar um caminhão de dinheiro para atingir uma pequena porcentagem da sua base.
Ou seja, não adianta você ralar o … na pedra para conseguir uma base fiel. Organicamente esquece que você não consegue entregar seu conteúdo. Agora, nem pagando rios de dinheiro você consegue acessar toda sua galera? É um modelo de negócios que só beneficia o Facebook.
E eis que o amigo Markinho, cavaleiro do apocalipse, anuncia que o Facebook não será mais Facebook: será Meta, o metaverso.
Considerado o “próximo capítulo da Internet”, metaverso é o mundo virtual tomando forma imagética, onde você poderá interagir, trabalhar, jogar, fazer compras, se divertir… se comportar virtualmente. Lembra do antigo Second Life?
Pois bem. O Facebook irá gradualmente se tornar o Second Life, um ambiente o qual você possui um avatar e trafega em mundo real/virtual, onde vale comprar imóvel para passar o final de semana, vale interagir com a galera em um pub, vale fazer reuniões de trabalho, vale ir até uma loja e comprar uma roupa… esse é o início, mas dá para imaginar que vale tudo.
Dá medo? Dá um pouquinho, mas não adianta colocar o cabresto e achar que isso não era inevitável. Vamos entender os pormenores, porque muita oportunidade pode sair daí.
O que é metaverso?
O metaverso é um universo virtual onde as pessoas vão interagir entre si por meio de avatares digitais. Esse ambiente será criado a partir de diversas tecnologias, como realidade virtual, realidade aumentada, redes sociais, criptomoedas, NFTs, e por aí vai. Ele não é a tecnologia em si, são essas tecnologias que irão garantir a interação e a passagem para dentro desse mundo.
A ideia, no grosso, é que seja uma Internet 3D, que converge tecnologias, possibilitando interações sem precedentes.
No “futuro consolidado” do metaverso, as pessoas poderão reproduzir todos os aspectos comportamentais da vida humana dentro do ambiente virtual. Em comunicado à imprensa, na ocasião do anúncio do rebranding da marca, Mark Zuckerberg disse o seguinte:
“Você será capaz de fazer quase tudo que você possa imaginar — reunir-se com amigos e família, trabalhar, aprender, brincar, fazer compras, criar —, bem como experiências completamente novas que realmente não se encaixam na forma como pensamos sobre computadores ou telefones hoje”.
Imagine: você sai com aquela/aquele garota/garoto que você está afim. Vão visitar um museu independente, cuja uma amiga está expondo. Você combina com ela/ele às 19 horas, na frente da Casa X, através do WhatsApp. O encontro virtual é uma delícia e ambos decidem, para fortalecer o trabalho dessa amiga, comprar uma obra dela, que é transacionada por um NFT.
Isso só será possível se todas as plataformas forem compatíveis entre si. Os avatares, as criptomoedas, o blockchain, a plataforma de conversação, o WhatsApp. O vice-presidente do aplicativo de mensagens, Andrew Bosworth, aliás, revelou com exclusividade ao TechTudo que uma espécie de WhatsApp 3D já está sendo desenvolvido.
“Nós estamos muito animados em trazer o WhatsApp para metaverso. […] Ele faz parte do tecido social da vida cotidiana de muita gente. Seria ingênuo de minha parte pensar que um usuário colocaria óculos VR na cabeça e, ao receber uma mensagem via WhatsApp, teria que retirar essa tela gigante para checar a informação numa tela diferente, do smartphone”.
É preciso ter em mente que o metaverso é um projeto em fase inicial – e que tudo o que se fala sobre ele são projeções. Essas especulações não partem do nada. Elas são elaboradas a partir dos planos das gigantes de tecnologia, as empresas que agora lideram e determinam o que é o futuro da Internet. É bem incerta a (i)materialidade do metaverso.
Para a maioria dos envolvidos, o metaverso será um complemento à Internet atual; não um substituto. Além do acesso via realidade virtual, o metaverso terá interfaces para PC, celulares e consoles de videogame.
“Eu acho que este é um ambiente persistente e síncrono onde podemos estar juntos, o que eu acho que provavelmente vai se assemelhar a algum tipo de híbrido entre as plataformas sociais que vemos hoje, mas um ambiente onde você está incorporado nele”, disse Mark Zuckerberg em entrevista ao site The Verge.
Além do Facebook, quem está de olho no metaverso?
O metaverso não é um projeto exclusivo da Meta.
A Microsoft, por exemplo, anunciou a chegada de avatares 3D ao Teams. A novidade faz parte do recurso Mesh, que atualmente oferece ambientes de trabalho em realidade virtual e realidade aumentada para o dispositivo de videoconferências, mas que no futuro englobará outras ferramentas de produtividade da companhia.
Segundo a empresa, a ferramenta é uma porta de entrada para o metaverso, onde os usuários poderão interagir uns com os outros através de “experiências holográficas compartilhadas”. Em uma publicação oficial, a Microsoft afirma que pensa no Metaverso como: “uma nova versão – ou uma nova visão – da internet, onde as pessoas se reúnem para se comunicar, colaborar e compartilhar com presença virtual pessoal em qualquer dispositivo”.
A NVIDIA criou a plataforma Omniverse, dando a liberdade para designers, artistas, engenheiros e revisores para trabalharem em tempo real em aplicações de software em um mundo virtual compartilhado. O serviço está sendo avaliado por mais de 500 empresas e recentemente recebeu integração com o software Blender e aplicativos da Adobe. Com o Omniverse, profissionais de diferentes áreas podem criar cenas digitais únicas, de forma colaborativa e simultânea.
Amazon, Epic Games, Roblox, Unity e Decentraland são apenas algumas das muitas outras gigantes que estão investindo nessa próxima fase da Internet, na qual a conexão 5G será indispensável.
O metaverso é mesmo o futuro das nossas criancinhas?
O que se promete de fato não é um futuro distópico. Mudanças sociocomportamentais ocorrerão obviamente, assim como aconteceram um abismo delas de 20 anos para cá. É o ônus e o bônus de se viver tempos exponenciais.
Mas fato é que, de novo, o que se fala sobre metaverso ainda é sobre projeção. Vários aspectos da tecnologia que temos hoje ainda precisam evoluir para que esse universo virtual se torne realidade, como a democratização da Realidade Virtual e Aumentada, Internet ultrarrápida e de baixa latência em massa e acesso à criptomoedas.
Mais: é necessário que empresas efetivamente construam suas plataformas compatíveis com o metaverso que disparar. Se os grandes tubarões oferecerem restrições quanto aos itens e experiências dos usuários oriundos de concorrentes, o metaverso como ele é pensado atualmente nunca chegará a acontecer. Teremos, no máximo, vários metaversos independentes, mas não uma experiência virtual geral e compartilhada por todos.
O ponto crucial, porém, são as questões éticas que o metaverso traz consigo. A carga do Facebook. Não adianta mudar marca e nome que você se abstém de toda a sujeira. Já levantaram o tapete. Não é razoável pensar que a companhia conseguirá garantir a segurança dos dados pessoais de seus usuários, especialmente em um futuro no qual vai dispor de muito mais informações.
Que bom que não é um conceito proprietário. Podemos ver inúmeros players saírem na briga por esse espaço.